Em fevereiro de 2012, o Bloco de Esquerda questionou Governo sobre o facto de o Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto estar a recusar o descanso compensatório aos médicos após estes terem efetuado 24 horas de serviço (Pergunta 2140/XII/1a).
À época, tinha entrado em vigor o Orçamento de Estado para 2012 (Lei no 64-B/2011, de 30 de Dezembro) que alterou profundamente algumas condições de trabalho dos profissionais de saúde, criando injustiças e equívocos quanto às horas extraordinárias e ao descanso obrigatório. O Governo foi repetidamente avisado para as consequências gravíssimas destas mudanças mas insistiu. Como seria de prever, estas alterações causaram forte contestação.
A situação atingiu uma dimensão tal que a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) fez publicar uma circular informativa clarificando os procedimentos a adotar, que constituíam (e bem), um recuo face ao preconizado (Circular 03/2012/UORPRT designada “Lei do Orçamento de Estado para 2012 – esclarecimentos relativos à aplicação dos artigos 30o e 33o da Lei n. 64-B/2011, de 30 de Dezembro). Relativamente ao descanso compensatório, esta circular esclarecia que se mantêm “inalteradas as actuais normas em vigor no que respeita ao descanso compensatório aplicável aos médicos, seja no regime de contrato de trabalho em funções públicas (CTFP), seja no regime de contrato individual de trabalho (CIT).”
No entanto, em 2012 não era isso que estava a acontecer no IPO do Porto, uma vez que a instituição se recusava a conceder o descanso compensatório. Em 2015, esta situação continua a arrastar-se fazendo-se sentir não só no IPO do Porto, mas também noutras instituições hospitalares do distrito, como sejam os hospitais de São João, Santo António ou de Matosinhos, o que é absolutamente inaceitável e incompreensível.
Na resposta à pergunta do Bloco de Esquerda, o Governo referia que “o descanso compensatório é devido, razão pela qual, os médicos que reúnam condições para dele usufruir (tenham realizado trabalho noturno entre todo o período compreendido entre as 22 horas de um dia e as 7 horas de outro).
Todavia, esta resposta não é tão contundente quanto seria desejável, uma vez que deixa a portaaberta à possibilidade de não efetivação do descanso compensatório quando se refere que os médicos “tendencialmente não devem ser escalados para trabalhar, antes de decorrido o período mínimo de 24 horas, a contar do términus do trabalho noturno que lhes conferiu aquele mesmo direito mas, se o forem, devem ver o seu período normal de trabalho diário do dia seguinte ser reduzido na proporção das horas de trabalho que excedem as oito horas”. Nesta resposta, o Governo deixa também uma margem de manobra bastante lata ao “dirigente máximo” a quem cabe, “aquando da elaboração e aprovação dos horários de trabalho, ter em consideração estas regras, a fim de permitir o melhor cumprimento do horário de trabalho, tendo em conta as necessidades de gestão e organização do trabalho hospitalar e médico”.
Esta situação carece de esclarecimento urgente e cabal. Não é concebível que o Governo faça interpretações criativas da legislação e que possa ter uma política de gestão de trabalhadores em que considera adequado do ponto de vista humano, clínico ou laboral que os médicos sejam privados de descanso compensatório após 24 horas de serviço. Esta é uma medida desumana e que pode mesmo colocar em risco os serviços, visto os clínicos estarem privados do merecido e necessário descanso. O Bloco de Esquerda considera fundamental que esta situação seja urgentemente clarificada, garantindo como regra o acesso ao descanso compensatório, a bem dos médicos e dos utentes.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério da Saúde, as seguintes perguntas:
1. O Governo tem conhecimento da situação descrita? Em que unidades hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (SNS) se regista recusa de acesso dos médicos ao descanso compensatório?
2. Que iniciativas vai o Governo implementar para garantir que todos os médicos que exercem funções em estabelecimentos hospitalares do SNS acedem de facto ao direito ao descanso compensatório?
3. O Governo está disponível para emitir uma circular informativa clarificando que o descanso compensatório tem que ser sempre assegurado a todos os médicos que exercem funções em estabelecimentos hospitalares do SNS?
4. Que medidas compensatórias vão ser implementadas para ressarcir os médicos que se viram privados de aceder ao descanso compensatório?
O Deputado e a Deputada
José Soeiro e Helena Pinto